2/16/2009

Unidos de Lucas 1987

Unidos de Lucas 1987

Enquanto o Tuiuti escolhe o samba para o enredo em homenagem a Vinicius de Moraes, sigamos o conselho do poetinha: “Recordar é viver”. A Unidos de Lucas ficou a um degrau de subir para o grupo principal apresentando em 1987 um enredo sobre o compositor. O samba de Lucas, escondido na última faixa do lado B do LP dos sambas-de-enredo de 1987, que incluía algumas escolas do especial, como Salgueiro, Ilha e Caprichosos, é uma pérola que deve ser mais conhecida. Sua leitura do enredo foi a de uma homenagem extremamente respeitosa, quase todo em tom menor, completamente absorto por um sentimento de saudade.

O início do samba ilustra, à perfeição, a estratégia dos compositores. O primeiro verso é um capítulo à parte, de belíssima melodia em tom menor, quase o transformando em um canto de lamento. Basta compará-lo ao primeiro verso do samba da Portela de 1969 (As Treze Naus), semelhante nas pausas e na letra (“Apesar de tantos séculos passados”). No “apesar” o samba da Portela vai ligeiramente subindo, seguindo os padrões tradicionais de melodia do samba-enredo. No de Lucas, o “através” é totalmente dominado por um tom menor, num murmúrio grave, completamente atípico, quase fantasmagórico.

Mas o deslumbrante da saudade – e da homenagem – é a possibilidade de reviver, de resgatar os momentos passados. Lentamente tentando se desvencilhar de seu lado de lamúria fúnebre, a segunda parte, após o segundo refrão, se concentra no retrato apaixonado e íntimo do poeta como observador do cotidiano boêmio do Rio de Janeiro. Ao citar seus quatro parceiros mais famosos, num esforço enumerativo que nunca perde o vigor melódico, o samba atinge suas notas mais altas. Em seguida, completa com dois versos de enorme poder de síntese, poesia e beleza: “O poetinha fez da vida / uma canção de amor sem fim”. Se o amor não é imortal, posto que é chama, como afirmou o poeta num de seus sonetos mais famosos (o Soneto da Fidelidade), os compositores ironicamente desejam contestar o mestre. Sua vida foi (é) “uma canção de amor sem fim”, sugerindo a perpetuidade de suas obras e de seu sentimento de vida mesmo após sua morte.

O terceiro refrão desponta então como natural continuidade dos versos anteriores, sintetizando em letra e melodia e essência do enredo, o papel da saudade, da memória, e da “vida após a morte”.

Mas não se pára por aí, e cada vez mais se percebe a extrema sensibilidade dos compositores. Ainda resta um discreto epílogo, comentário ambíguo, misto de uma profunda dor e resignação com um sentimento de esperança: “E entretanto é preciso cantar”. O samba claramente se apresenta como um canto de lamento (“entretanto”), que nos brinda com um sutil comentário sobre o papel da arte, da canção e – por que não? – do Carnaval no cotidiano de um povo.

Marcelo Ikeda
17/09/2003.


Unidos de Lucas 1987

Através de suas obras geniais
Seu nome foi consagrado na galeria dos imortais
É carnaval, é alegria
Lucas faz com euforia
Um tributo a Vinicius de Moraes
Oh! Menestrel
Diplomata, jornalista, escritor
Compositor de rara inspiração

[Peças teatrais, temas colossais
Como Orfeu da Conceição]

Olha que coisa mais linda, mais cheia de graça
Quanta imaginação

[A beleza, a poesia
Cantada em forma de canção]

Sensível para o clássico e o popular
O piano, o bar, a esquina
E o papo com as meninas a beira-mar
E com Toquinho, Carlos Lira
Baden Powell e Tom Jobim
O poetinha fez da vida
Uma canção de amor sem fim

[Oh mestre !
Como recordar é viver
E por falar em saudade
Onde andará você]

E entretanto é preciso cantar
Para alegrar a cidade
Nesta festa popular

2 Comments:

Blogger Mav animes said...

Esse enredo marcou uma época em minha vida..... já faz 22 anos que ainda me emociono ao cantar ele... parabéns Lucas pelo excelente enredo.
MAV_RJ

9:54 PM  
Blogger Mav animes said...

Esse enredo marcou uma época em minha vida..... já faz 22 anos que ainda me emociono ao cantar ele... parabéns Lucas pelo excelente enredo.
MAV_RJ

9:55 PM  

Postar um comentário

<< Home